ÉVORA MINHA CIDADE

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

LEMBRANÇAS DE ÉVORA




Há mais de quarenta anos que me fiz mais uma habitante desta bela cidade museu, que me encantou com a sua história e beleza de encantar qualquer pessoa, Também eu tal como ela fiz por cá a minha história.
São 45 anos de uma vida cheia de tantas coisas boas tão boas, que não resisto a lembrar algumas, das muitas por onde passei, quando cheguei a esta bela cidade, tinha a penas 13 anos pois até então vivi quase sempre com os meus avós, e tios paternos.
Como eu não me canso de dizer, e muito menos de pensar, fui uma menina feliz, pois na minha Aldeia era a menina da minha gente, falo daquela gente, que sempre me deu tudo o que não tinha, para eu ser feliz, que me ensinou a dar, e receber, e com a sua humildade e amor aprendi o sentido da vida.

Nasci acompanhada, de um glaucoma que sempre me causou grande sofrimento, e ficou cada vez mais complicado até que chegou à cegueira total, mas nem por isso fez de mim uma criança infeliz, sempre recebi muito amor e dedicação, à minha volta só havia, ternura e carinho, tudo era feito de maneira que eu não me lembrasse do meu sofrimento físico, que sempre foi e continua a ser, muito grande, aos meus 26 anos, a minha doença complicou de tal maneira, que foi obrigada a tirar o olho esquerdo, e como tudo foi piorando aos 37 anos tive de passar pelo mesmo, pois foi-me tirado, o olho direito, poço dizer que passados quase 30 anos, ainda não sou capaz de lidar com esta situação, ainda hoje tenho muitos momentos de grande revolta, mas tento que as pessoas não percebam as minhas fraquezas, e por isso e muito mais não vou deixar de lutar, nem de gostar da vida, nem das pessoas que amo, pois é por mim e pela minha família que eu vou continuar a amar a vida.

Na casa dos meus avós os dias passavam entre boas e bonitas brincadeiras, com as minhas amiguinhas, e também com algumas das minhas primas maternas, a quem ainda hoje, dedico uma grande e bonita amizade, que de certo irá até ao fim das nossas vidas, gostávamos de conviver junto da natureza, ermos para o campo apanhar flores e com elas fazer lindos colares e outros enfeites que muito nos divertiam, também recordo os apetitosos lanches, que a minha tia Naica, nos fazia e nos sabiam mais que bem, a minha tia Anica era uma velhinha que também morava, no monte dos meus avós, monte que antes tinha sido dela, a tia Ana Pereira foi sempre muito querida para mim, e tratava me com grande amor e dedicação, pois fez de mim a herdeira de tudo o que tinha da sua filha que por doença desconhecida, morreu era ainda uma criança, só lamento, quando fiquei mulher, já não ter nada nem saber para onde foram todas as coisas que com tanto amor me ofereceu.
Lembro-me com saudade, das minhas idas para a escola só para conviver mas mesmo assim era para mim um dos bocadinhos felizes, em quanto todos faziam e aprendiam, os trabalhos da escola, eu a penas podia decorar as lições, que eram lidas pela professora, mas para mim foi uma felicidade, pois quando voltava para casa, sabia tudo na ponta da língua, todos ficavam contentes, e ainda me ajudavam mais, também algumas vezes passava bons bocadinhos com algumas professoras que de vez em quando ficavam na casa dos meus avós, porque nessa altura, o meu avô por mérito próprio era, o Presidente da junta de freguesia, da Graça do divor, e por isso foi o meu avô, que mandou construir a escola cedendo para isso o terreno, que fazia parte da sua propriedade, tudo o que vivi eu nunca poço esquecer, também não posso esquecer as saudades que tenho de quando me sentava no campo acompanhada pelo meu amigo cão, falo do senhor pangalhadas, uma personagem que durante muitos anos fez parte importante da minha história, pois era quase sempre com ele que eu ia, para com muita atenção ouvir o barulho da natureza, e o cantar dos passarinhos, que muito alegravam as minhas manhãs, e também os meus fins de dia, lembro-me como era lindo o nascer e pôr do sol, pois nesse tempo eu ainda via alguma coisa, embora pouco, mas dá para lembrar e recordar toda a beleza que me rodeava, na época em que nasci a minha cegueira era considerada uma doença muito grave, pois não havia esperança de melhoras, e muito menos de cura, mas nem por isso os meus primeiros 13 anos deixaram de ser os melhores anos da minha vida, também não poço esquecer, uma das pessoas, que nessa altura foi para mim, talvez a mais importante, lembro-me com muita saudade, do carinho com que sempre me tratava, lembro-me dos serões de Inverno, sentado a lareira, comigo ao colo, tinha sempre uma história, para me contar, ou então cantávamos os dois as cantigas daquele tempo, que ainda hoje muito gosto de ouvir, falo do meu avô, que nesse tempo era pessoa, a quem todos tinham respeito, foi um homem justo e de bom coração, toda a gente tinha por ele um grande respeito, e afeição, lembro-me das suas palavras quando me dizia para eu não chorar, porque me fazia dói-dóis, e ele ficava triste, como eu me lembro do calor do seu colo, dos seus abraços, e dos seus beijinhos, sem conta, também me lembro como me sentia forte quando o meu avô, me dizia, não tenhas medo, minha querida, o avô, está aqui, e nada nem ninguém te vai fazer mal, era com o meu avô, e com os meus tios que quase sempre andavam comigo ao colo, e não se cansavam de me encher de carinhos, eu fui sempre a sua menina, falo do meu querido avô, que recordo e guardo para sempre no meu coração, tenho a certeza, se ele me estiver a ver, está feliz e orgulhoso da sua menina.



Pouco tempo depois de chegar a Évora tive a sorte de conhecer grandes e bons amigos, que muito me ajudaram a ir ao encontro do desconhecido, foi pois assim que começou um dos bonitos capítulos de que ainda hoje recordo com saudade, pois fui convidada para cantar no grupo coral da Igreja do Carmo daí foram-se abrindo portas e chegaram outras coisas que gostei muito de fazer, fui também levada para a legião de Maria, trabalho que adorei fazer, pois havia de tudo um pouco dedicado aos menos protegidos pela sorte, durante alguns anos fiz parte de um grupo de bons e dedicados amigos, que me mostravam todos os dias que a vida deve ser igual para todos, assim me foi dada a oportunidade de participar em festas, acampamentos, visitas a hospitais, e a casas de pessoas a quem a vida não deu o privilégio do bem estar, por isso vivendo menos bem, levando alguns bens necessários para uma vida um pouco melhor, e com algum conforto, cuidar, e ajudar as crianças que por razões várias ou pouca sorte não tinham nada nem ninguém, que lhes desse o que qualquer criança tem o direito de ter.

Lembro-me dos bonitos teatros, e das festas em que colaborava, umas vezes a cantar outras a representar, sempre que chegava aquele momento sentia-me muito nervosa mas depois de entrar em palco tudo corria bem, e acabava muito melhor, deixando-me alegre e feliz, pois esses inventos eram sempre dedicados aos que viviam menos bem e tudo o que recebíamos era muito bem vindo.

Mas também tive algumas coisas, más muito más, feita de grandes lutas, algumas bem complicadas mas tenho que todos os dias agradecer a Deus e à oportunidades que a vida me deu e também há minha família e amigos de que muito gosto, alguns já ficaram pelo caminho, e eu continuo a lembra-los com muita saudade e estão bem guardados no meu coração para sempre e depois vêem as recordações, algumas de cair a lágrima outras de rir de felicidade pois foi aqui que tudo começou na minha vida de verdade, foi aqui que encontrei pessoas muito importantes para mim, porque sempre estão ao meu lado nos bons e maus momentos.

Foi nesta bela cidade que encontrei o meu caminho, cheio de coisas bem diferentes umas das outras mas por todas elas valeu a pena e vou continuar a lutar porque amo a minha família, e amo muito todas as crianças do mundo o meu maior desejo era fazer os nossos meninos e meninas bem felizes, pois quero para elas um mundo com paz e muita saúde, sei que quando eu for embora de vez deixo muitas coisas por fazer que gostava de ter feito, mas também fiz muitas coisas que me deram muita alegrias e bem estar.

Hoje sou uma pessoa preocupada com o futuro das nossas crianças, pois sou mãe e avó, foi alguns anos que nasceram aqui os meus filhos e o meu neto, 3 pessoas a quem amo de tal forma, que não é fácil encontrar palavras que transmitam os meus sentimentos, são sem duvida as pessoas, mais importantes para mim, embora com os meus filhos nem sempre estou de acordo com coisas das suas vidas, hoje eles já são homens e donos da sua vontade; a verdade é que os filhos para as mães, não têm idade, nem defeitos, para as avós os netos são perfeitos, quem ama erra e eu sei que cometo erros por quem muito amo, pois são a maior razão da minha vida.

Também os meus sobrinhos de quem muito gosto, e desejo o maior bem, pois também, sinto que eles me dedicam um grande carinho.

Foi em 1964, que aqui também nasceu, um dos meus grandes amores, pois, vou falar um pouco de uma pessoa muito importante para mim, temos 14 anos de diferença, por isso sinto nela a filha que não tive, mas decerto gostaria de ter, falo da minha irmã, pois tenho por ela um tão grande amor, que me lembro com saudade dos tempos em que ela me chamava Mãe, hoje ambas somos adultas e cada uma tomou o seu caminho, mas nem por isso deixamos de ser o que sempre fomos, pois nada nos vai separar, temos diferentes formas de pensar e de estar, mas nada nos impede de sermos o que somos, duas irmãs, duas grandes e boas amigas, pois para mim a minha irmã, continua a ser a minha menina muito querida, a minha maior amiga, só tenho pena que ela não seja mais presente, mas cada um é igual a si mesmo.

Agora falo do meu irmão, que também amo muito, e que com muita pena de todos fez a escolha errada pois deixou tudo em troca de nada, resta-nos a esperança, que ele acorde e volte a ser o que sempre podia ter sido, fez tantas coisas erradas na vida, talvez nem ele saiba porquê.

Somos 3 filhos de uns pais que nos trataram de maneiras muito diferentes, ainda hoje eu não entendo por qual a razão de ser nem qual o motivo, o meu pai tem quase 80 anos, e ainda hoje eu tenho momentos em que penso que o meu pai nunca me amou como uma filha, nem dedicou grande atenção ao meu tão grave problema, só peço a Deus que me dê o seu perdão, se estiver errada, o meu pai é, uma pessoa de sentimentos escondidos, e amores preferidos, que não sabe dar afectos, nem transmitir o que sente, pelos outros ou até mesmo por si próprio, pessoa fria que finge não perceber, o que está à sua volta, está fechado nele mesmo caindo cada vez mais ficando velho e perdendo a autoridade e arrogância, com que gostava de tratar os mais fracos, porque teria sido assim, acho que nem ele sabe responder a essa pergunta.

A minha Mãe é uma mulher de uma grande riqueza de sentimentos, e de um grande coração, tem nesta altura 78 anos, muito sofridos e amargurados, companheira do meu pai há 58 anos a quem deu tudo o que tinha em troca de quase nada, hoje resta aos dois uma vida mal vivida e a maior parte cheia de más recordações, e de coisas que só lhe fazia bem esquecer, lembro-me quando era menina que a minha mãe me lia histórias e eu gostava tanto de ouvir a minha mãe ler para mim, que nunca vou esquecer esses bocadinhos que recordo com muita saudade e ficam para sempre no meu coração, nessa altura a minha mãe era uma jovem, de grande beleza, nas suas atitudes, de bondade, a minha mãe ainda hoje está plantada no vazo onde tenho todos os meus amores perfeitos, todos gostavam dela e sempre lhe deram muito valor, pobre mãe, pobre pai, que nem percebem que os filhos os amam e sofrem por velos nesta estranha e má forma de vida, mas o pior é que não podemos fazer nada, resta pedir a Deus que não os deixe sozinhos.

Desejo a todos uma vida feliz foi também há muitos anos que entrei na vida do trabalho nesse tempo para uma pessoa cega não era tarefa fácil e por isso foi um pouco complicado, mas a minha força, e necessidade, deram-me a coragem necessária para nunca deixar de lutar por tudo o que vale a pena, com muitas barreiras e portas mal abertas, mas o meu bom Deus a minha força e alguns amigos e a minha família, foram para mim de grande valor a ajuda, E eu por mim e pelos meus filhos, pelo meu neto, pelo meu marido, quero continuar a lutar e a viver por isso peço a Deus que sempre me dê forças e vontade de lutar e ter alegria para dar a toda a gente que precisa de mim. Não me conformo com a mudança dos tempos e muito menos com a das vontades, a menina vida não devia esquecer os menos protegidos pela sorte, nomeadamente as nossas crianças que não têm culpa de nada, só me resta a grande fé e a esperança que tenho no meu bom Deus.

Generosa 10 de Junho de

Sem comentários:

Enviar um comentário